Num momento tão crítico como esse em que vivemos onde já se contabilizam mais de 60 mil mortos por Covid-19 no Brasil, qual é a razão de nossa esperança? É possível termos esperança diante de um cenário tão trágico como o presente? A esperança é a última que morre? O que devemos esperar de toda essa situação? Será que é possível viver sem ter esperança?

Foram sobre essas questões que tratei recentemente num colloquium com meus alunos por videoconferência. Em primeiro lugar, comecei dizendo que é preciso acabarmos, tirar de nossa mente, excluir do nosso pensamento, a ideia de que a esperança é a última que morre. Quando dizemos isso estamos confirmando que a nossa vida é um fracasso, que tudo o que vivemos ou fazemos não vale a pena. Que tudo em nossa vida é uma grande mentira. E eu sei que isso não é verdade. Que a essência humana é a verdade e não a mentira.  

É necessário pensarmos o contrário. Programarmos a nossa mente para termos esperança. Temos que dizer que a esperança não morre jamais. Que é ela que sustenta a nossa vida, que nos mantem de pé. Que uma vida sem esperança não é vida. Nós, seres humanos, formos criados para voar, não para rastejar como as cobras. Fomos criados para voar como as águias. Só que para isso acontecer é preciso te esperança. Esperança na vida. Esperança no amor. Esperança nos afetos. Esperança na família. Esperança em nós mesmo, no outro, no diferente, que tudo vai passar, que vamos ultrapassar essa crise como tantas outras que já superamos.

Respeito todas as opiniões adversas, mas eu preciso dizer isso, toda vez que eu ouço alguém dizer que “a esperança é a última que morre”, eu vejo o quanto a filosofia faz falta na vida e na formação dessa pessoa. Logicamente que a esperança de que falo aqui é aquela em que a pessoa vai à frente, procura dar o primeiro passo. Aquilo que os italianos chamam de “vado io”, ou “vou eu”, em tradução livre. É preciso ir à frente, lutar por seus objetivos, não ficar “com a boca escancarada, cheia de dentes esperando a morte chegar” como cantou Raul Seixas.

Gosto muito de uma frase do filósofo brasileiro Mario Sergio Cortella, que está complemente de acordo com a ideia de que venho tratando aqui. A frase é essa: “Vaca não dá leite”. Repito. “Vaca não dá leite” – diz ele. Não é verdade, vaca não dá leite. Mas o que diz o senso comum, os não iniciados na arte do pensamento, da filosofia? Dizem o contrário desse pensamento, que vaca dá leite. Para esse grupo de pessoas é isso: “vaca dá leite”. Mas não! Vaca não dá leite, você tem que tirar, e é um processo complexo. Tirar leite da vaca não é para qualquer um, para os fracos. A vida é assim, é para os fortes!

Nesse sentido, o poeta gaúcho Mario Quintana também contribui com o tema desse artigo. Diz ele: “Um dia, pronto, me acabo. Seja o que tem que ser. Morrer, o que me importa? O diabo é deixar de viver”. A vida é assim, não é para os fracos. Não é isso gente? Não podemos perder a esperança de que homens e mulheres vivam em paz, de que as minorias étnicas sejam respeitadas, que o amor e a paz sejam os pilares dessa nova sociedade pós-pandemia, enfim, que dias melhores virão.

Millôr Fernandes tem uma frase que eu sempre gosto de trazer à tona. A frase é a seguinte: “O importante é ter sem que o ter te tenha”. Ter aqui é esperança e não poder econômico. Ou seja, precisamos ter esperança mesmo nos momentos mais difíceis de nossas vidas. Repito. Ter esperança não é ficar parado, de braços cruzados, esperando a vida passar. Ao contrário, é manter a vida em perspectiva, buscar realizar seus sonhos, seus objetivos. Não podemos fugir dessa sina. O segredo da vida é batalhar para conquistar. É correr para alcançar o pódio. É “esperança do verbo esperançar”, como diz Paulo Freire.

Por fim, nós seres humanos, somos feitos da mesma matéria que os sonhos. Uma pessoa sem sonho é como uma pedra, não tem vida, não tem esperança. Ou como disse o profeta Jeremias (29:11): “Porque sou eu que conheço os planos que tenho para vocês’, diz o Senhor, ‘planos de fazê-los prosperar e não de causar dano, planos de dar a vocês esperança e um futuro”. É nisso que eu acredito, é isso que eu espero, essa é a minha esperança!

Luís Lemos

Filósofo, professor universitário e palestrante. Autor dos livros: O primeiro olhar – A filosofia em contos amazônicos (2011), O homem religioso – A jornada do ser humano em busca de Deus (2016); Jesus e Ajuricaba na Terra das Amazonas: Histórias do Universo Amazônico (2019). E-mail: [email protected]

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