Este é o nosso terceiro causo pedagógico: “O professor que foi expulso de sua terra natal”. Antes, porém, devo esclarecer que exílio é o ato ou efeito de mandar embora, expulsar, isolar, uma pessoa ou um grupo, que faz oposição a política ou a religião dominante de seu país. Pois bem, foi isso que aconteceu com o professor João da Silva*. Depois que ele desmentiu, ao vivo, pela internet, o prefeito de sua cidade, este lhe convocou para uma reunião emergencial no gabinete da prefeitura.

Quando o professor João da Silva lá chegou, o prefeito foi logo lhe dizendo: – Ou o senhor deixa à cidade ou eu vou lhe exonerar. – Qual é a minha segunda opção? – Não existe segunda opção. Ou vai embora ou o senhor vai cair na miséria. – Tudo isso porque eu falei à verdade? Que o senhor está assaltando a prefeitura, desviando o dinheiro da formação dos professores, da merenda escolar… – Chega! Não quero mais ouvir essas acusações falsas. Será que um simples professorzinho que nem o senhor pode mais que eu como prefeito? – Tenho certeza que não senhor prefeito. Mas uma coisa eu sei: sou mais feliz que o senhor. Ah! Isso eu lhe garanto! Um dos assessores do prefeito entrou na conversa: – Está aqui o seu passaporte. Vá embora para bem longe daqui. Nos deixem em paz.

O filho do professor João tentou entrar em contato com ele, mas o telefone estava fora de área. Ligou para a Secretaria de Educação, mas não obteve sucesso. Ninguém lhe atendeu. Silêncio total. Quando alguém, depois de três dias, entrou em contato com a família, à mando da prefeitura, foi para entregar ao seu filho uma pasta vermelha, e nela estava escrito, com letras de forma: “DOSSIER DO PROFESSOR COMUNISTA”.

– Não pode ser, o meu pai nunca foi comunista. Tem alguma coisa errada aqui. O meu pai era um homem justo, isso sim, e não comunista. Será que comunismo mudou de significado? Pelo contrário, o meu pai detestava à injustiça, à corrupção e o totalitarismo. Depois que algumas lágrimas caíram dos seus olhos, pressentindo que alguma coisa de muito ruim estava acontecendo com o seu pai, ele disse:  – Se aconteceu alguma coisa com o meu pai, esse prefeito tem culpa. Tudo isso que vem acontecendo, essa perseguição toda a nossa família, foi porque o meu pai desmascarou o prefeito dessa cidade. Ele sim é um comunista, um pilantra, um safado…

O policial que lhe entregou o dossier lhe disse: – Acho melhor você calar essa boca se não pode acontecer o mesmo com você! – E o que aconteceu com o meu pai?  Cadê ele? – Não sei de nada. Sei que para o seu próprio bem é melhor você ficar calado. Tem gente graúda metida nisso tudo. Eu só cumpro ordem.

Na manhã seguinte, os jornais da cidade, três no total, que o prefeito controlava e com matéria paga, estampavam em suas capas à seguinte manchete: “Professor comunista abandona a cidade e vai morar em Paris com sua amante”.

Alguns dias depois, bem de madrugada, o professor João apareceu em sua casa. A alegria era contagiante no rosto do seu filho adolescente. – Pai, por onde o senhor andou esse tempo todo? Onde o senhor estava? Eu e a mamãe estávamos preocupados com o senhor. Sem conseguir falar direito, muito emocionada sua esposa lhe deu um beijo afetuoso. – Oi amor, seja bem-vindo! Sei que tudo isso é intriga da oposição. Lhe conheço e não vou lhe abandonar numa hora dessa. – Então vamos, meus amores! Eu só vim buscar vocês. No caminho eu explico tudo. 

Eles foram viver fora do país. Lá, no exilio, começaram a andar de um lado para o outro, sem rumo, pelo simples prazer de ser livre. Muitos e muitos anos depois, o professor João da Silva tinha mudando de nome. Agora chamava-se Moisés Melquisedeque* e voltou a ministrar aula, dessa vez na Universidade Pública de sua cidade natal. O seu filho, tornou-se, também, professor nessa mesma universidade. Juntos, receberam placas e homenagens com nomes de ruas na cidade, enquanto o prefeito que o mandou para o exílio ninguém lembra se quer o seu nome, foi esquecido pela população e pela história da cidade!

Não demorou muito e o professor João descobriu em suas pesquisas uma lei muito antiga que proibia partidos e fábricas que não tivessem como princípio “o bem comum”, ou seja, que não fossem “comunista”, não podiam se instalar na cidade. Um ano depois dessa descoberta, não existia mais políticos corruptos na cidade, e tudo era de todos. A corrupção foi extinta, a pobreza também, a fome, a miséria, a injustiça, a indiferença… Tudo era de todos e para todos. À liberdade reinava nas cercanias e o povo vivia feliz!

*Nomes fictícios, pessoas reais.

Luís Lemos

Filósofo, professor universitário e escritor, autor do livro: “Jesus e Ajuricaba na Terra das Amazonas”.
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