Dando continuidade à série “Vozes da Educação de Manaus”, hoje transcrevemos aqui uma entrevista, feita pelo sistema de troca de mensagens (WhatsApp), com o professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), José Alcimar de Oliveira, como segue: 

Pergunta 1. Comecemos pela origem de tudo. Conte-nos quem é você. Onde e quando tudo começou? 

Sou José Alcimar de Oliveira, filho de pais retirantes cearenses, Ana Nilda de Oliveira e Marcondes Pinheiro de Oliveira, ambos falecidos, que em 1955 saíram de Jaguaruana, CE, fugindo da seca e, sobretudo, das cercas do latifúndio capitalista, vieram tentar a vida no Amazonas. Sou o primeiro de 12 filhos, nascido em 15 de setembro de 1956, na Comunidade de Bela Vista, em Manacapuru, às margens do rio Solimões. Meus saudosos pais, mesmo privados da educação escolar pelo Estado brasileiro, tudo fizeram para que seus 12 filhos escapassem ao jugo do analfabetismo. Meu pai não sabia ler e minha mãe cursou até a terceira série primária. Mas eram pessoas sábias, formadas no chão da escola da vida. 

Pergunta 2. Quando você começou na educação? 

Sou professor do Departamento de Filosofia, da Universidade Federal do Amazonas, desde 1986. No período de 1978 a 1982 cursei Filosofia e Teologia no antigo CENESCH, Instituto vinculado ao Regional Norte 1, da CNBB. No período de 1980 a 1985, fiz o curso de Licenciatura em Filosofia na Universidade Federal do Amazonas. No período de 1995 a 1998, iniciei e concluí o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Educação, na Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas. No período de 2008 a 2011 igualmente iniciei e concluí o doutorado no Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia, no Instituto de Filosofia, Ciências Humanas e Sociais, da mesma Universidade. 

Pergunta 3. De lá para cá, qual é a maior mudança que você percebe? Poderia explicar, brevemente! 

Cursei Filosofia e Teologia nos luminosos anos do final de 1970 e inícios de 1980, que muitos, por ignorância consideram a década perdida. Foi a época da volta dos exilados pela ditadura empresarial-militar implantada no país a partir de 1º de abril de 1964 e formalmente encerrada em 1985, com a eleição indireta de primeiro presidente civil, mas ligado ao regime militar. Em 1978 tornei-me Frade Franciscano da Terceira Ordem Regular, recebendo a ordenação sacerdotal em 1983. De 1984 a 1986 lecionei no Curso de Filosofia do CENESCH. Durante um ano, em 1986, também lecionei no Instituto de Educação do Amazonas. Ao contrário da regressão, miséria e desalento que hoje se abatem sobre o Brasil, naqueles anos, final da década de 1970 e decorrer da década de 1980, vivíamos no país a esperança de construir um Brasil-nação, para usar a expressão do grande Octavio Ianni.  

Pergunta 4. Você se considera um professor realizado? 

Sartre dizia que é preciso agir sem esperança. Tendo a concordar com o autor de O Ser e o Nada, que visitou Manaus em 1960, numa época em que o Brasil ensaiava dar certo. A esperança verdadeira, não vazia ou fraudulenta, é a que nasce da ação, da combinação gramsciana do pessimismo analítico da inteligência com a vontade do agir político. É este o horizonte que anima minha prática docente, de educador coletivo. 

Pergunta 5. Com toda essa sua experiência na educação, conte uma coisa interessante, pode ser pitoresca, que aconteceu com você. 

O caminho é seguir fazendo caminhos, abrindo veredas, para nunca permitir que a educação se aparte da práxis. Neste ano de 2021, em que comemoramos o centenário de nascimento de Paulo Freire, vale sempre trazer a memória o princípio de sua pedagogia dialética e libertadora: a prática de pensar a prática é a melhor maneira de pensar de forma correta e verdadeira. 

Pergunta 6. Quais são os seus planos na educação? Pretende continuar estudando? Quem sabe fazer o mestrado, o doutorado, o pós-doutorado, publicar um livro…? 

Seguir na luta é o plano. Porque somente a luta muda a vida. Somente a grande luta muda a história. É preciso trabalhar, na unidade teoria-prática, para ampliar os espaços reflexivos, porque no dia em que o povo brasileiro se der conta de que a maior tragédia do nosso processo educacional é a não compreensão política dessa tragédia, aí a prática educativa se converterá em força material e efetivamente transformadora. A educação então terá como fundamento a prática e o trabalho se afirmará como princípio educativo, o que é impossível enquanto o trabalho prevalecer na forma alienada requerida pela produção capitalista. 

Pergunta 7. Quais são as suas influências pedagógicas, isto é, quais foram os autores que mais lhe influenciaram ou que lhe influenciam na formação acadêmica, profissional, humana, espiritual? 

Para isso, é preciso pensar a educação como prática de liberdade coletiva. Já é tempo de o Brasil honrar seu maior educador, Paulo Freire. Para quem vive e pensa a educação no Brasil deveria ser obrigatório conhecer a Pedagogia (dialógica) do Oprimido de Paulo Freire. Não há como as instituições de ensino, do fundamental ao pós-doutorado, ensinar e promover a leitura da palavra sem que esta tenha como ponto de partida a leitura de mundo. Em maio de 1982, quando esteve pela primeira vez em Manaus, ouvi de Paulo Freire que é necessário compreender a compreensão do educando. Fazer isso, é reconhecer que em cada educando habita um educador. É um princípio pedagógico e epistemológico fundamental. 

Pergunta 8. É possível ser professor e não gostar de ler? Você está lendo algum livro no momento? Poderia citar? 

Quem educa está sempre envolvido com a leitura, porque é impossível educar sem cultivar o gosto pela leitura. Já passa do tempo da escola pública brasileira substituir depósitos de livros por bibliotecas amplas, com profissionais, educadoras e educadoras, com formação em Biblioteconomia, em todas as instituições de ensino. As armas verdadeiras, capazes de tornar um povo soberano, autônomo e crítico, são aquelas construídas no espaço escolar. A educação encontra no povo a sua verdadeira força material. O povo encontra na educação a sua verdadeira força teórica. 

Luís Lemos é filósofo, professor universitário e escritor, autor do livro: “Jesus e Ajuricaba na Terra das Amazonas”.

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