O médico Felipe Peixoto Nobre detalhou em entrevista ao jornal O Globo, nesta segunda-feira (4), como ocorria o que ele classifica de assédio por parte da operadora de saúde Hapvida para ele e outros colegas cumprirem metas de prescrição de “kit covid”, composto por remédios sem comprovação comprovada conta o coronavírus.

Mensagens, áudio e relatos revelados pelo jornal na sexta-feira mostraram que as intimidações envolviam orientações diretas para “fazer o convencimento” de pacientes para o uso de cloroquina.

“Éramos vistos como inimigos e marcados com uma bandeira vermelha. Recebi quatro visitas no ambulatório do médico-líder em menos de um mês. Me disseram que eu corria o risco de ser desligado do plano, caso eu não prescrevesse o “Kit Covid”. A chefia sabia exatamente quem prescrevia ou não, porque estavam fazendo auditoria nos prontuários, um absurdo total”, disse Nobre.

O médico afirma ainda: “não interessava se o paciente sabia ou não dos riscos, a orientação era: tem que passar e não cabe discussão. Eu saí em maio de 2020, mas soube por colegas que eles continuaram fazendo isso até março deste ano”.

O médico disse ainda que a operadora se recusava a fazer testes de Covid-19 em pacientes suspeitos e que a falta de triagem inicial acabou “gerando ainda mais a contaminação do ambiente”.

“O Ministério da Saúde havia baixado orientação de testar todo (caso) suspeito, mas o plano não seguiu isso. Recebi várias negativas de exames pedidos. Me lembro de ao menos dois casos: um de uma senhora de idade com comorbidades e outro de uma enfermeira que trabalhava no hospital, as duas com sintomas de gripe. Me disseram que o teste era só para pacientes com indicação de internação”, relatou.

O outro lado

A Hapvida afirmou em nota que a fase inicial da pandemia foi marcada por “incertezas”. “No passado, havia um entendimento que a hidroxicloroquina poderia trazer benefícios aos pacientes. No melhor intuito de oferecer todas as possibilidades aos nossos usuários, houve uma adesão relevante da nossa rede, que nunca correspondeu à maioria das prescrições”.

Sobre a pressão exercida sobre os médicos para que receitassem o “kit covid” para os pacientes, a empresa afirmou que a prescrição da cloroquina ocorria “sempre durante consulta, de comum acordo entre médico e paciente”, e que “respeita a autonomia e a soberania médica”. A operadora também declarou que a adoção do medicamento foi “sendo reduzida de forma constante e acentuada”, e que a prática teria deixado de ocorrer “há meses”.

Neste sábado, o vice-presidente da CPI da Covid, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) publicou no Twitter que o “Hapvida é mais um caso que a CPI terá que investigar”. (Revista Fórum)

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