Nas duras e amargas andanças da vida, nortistas, sulistas, caipiras, pretos, amarelos ou indígenas encontram na fé o braseiro, mesmo com ardor nos pés, para caminhar rumo a novos horizontes. Foi esse o sentido decantado pelo Boi Caprichoso, no segundo espetáculo “No Braseiro da Fé, Esperança é Minha Luz”, apresentado na noite deste sábado, (29/06).

Com os 21 itens em evolução, o bumbá mostrou a força da fé de quem reza o terço nas romarias, abre giras nos terreiros, faz invocações as entidades da floresta ou banha-se com o perfume das encantarias. Na fé e na esperança, o Caprichoso narrou como uma nação múltipla e sincrética se mantém firme na luta para vencer as adversidades cotidianas, com respeito ao princípio do sagrado.

O bumbá mergulhou nas raízes do povo brasileiro para cantar a harmonia da vida, cujo o objetivo é promover o respeito à pluralidade como chave fundamental ao início de uma caminhada transformadora da pátria opressora em mátria libertadora. Com a alegoria “Mátrias da Fé”, dos artistas Aldenilson e Paulo Paulo Pimentel, o Caprichoso formou um altar multicultural na arena.

Na segunda alegoria “O Sacaca da Floresta”, do artista Nei Meireles, o touro negro reverenciou, em Figura Típica Regional, o dom da cura herdado por caboclos de velhos pajés, por meio de ervas da Amazônia, seja em sessões de pajelanças nas aldeias ou em terreiros sagrados de antigos quilombos. Na terceira alegoria, também de Nei Meireles, a Exaltação Folclórica “Boi de Encantaria” exaltou a conexão espiritual, mágica e artística de Parintins com o Maranhão, por meio das relações culturais.

Na Lenda Amazônica, o Caprichoso revelou o reino de Aruanda, mundo onde habitam “As Princesas Turcas Encantadas na Amazônia”, do artista Márcio Gonçalves. O momento narrou a viagem de Mariana, Erundina e Toya Jarina, as três filhas do sultão turco Toy Darsalam, na época das cruzadas cristãs em Jerusalém, que atravessaram um portal místico no estreito de Gibraltar e despertaram em Encantaria na Amazônia.

Com a alegoria “Caruana, a Fé que Vem das Águas”, confeccionada pelos artistas Estevão Gomes e Marlúcio Pereira, as tribos do Caprichoso retrataram espíritos encantados, auxiliares de pajés caboclos, habitantes dos peraus dos rios amazônicos, com ênfase à história da sacerdotisa Zeneida Lima, da Ilha de Marajó, Pará, em uma viagem ao mundo sobrenatural.

Simbologias ancestrais das heranças culturais brasileiras, danças cerimoniais, xamânicas, cânticos, música e encantados levaram à arena a representação religiosa do Ritual Indígena Kalankô – O Canto para a Jurema Sagrada, alegoria do artista Kennedy Prata. No Caprichoso, o rito toré, apagado pela unificação pós colonização dos índios do Nordeste, celebrado pelo figura do pajé, personagem principal, com cânticos transmitidos de geração à geração, ganhou encenação alegórica e dramática como expressão de comunhão de fé repassada também à grupos afrodescendentes na era contemporânea.

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