O desabafo do governador Flávio Dino é apenas amostra da repercussão de mais uma brincadeira de mau gosto do presidente da República: “Bolsonaro veio ao Maranhão com sua habitual falta de educação e decoro. Fez piada sem graça com uma de nossas tradicionais marcas empresariais: o Guaraná Jesus. E o mais grave: usou dinheiro público para propaganda política. Será processado”.

Tenho cá minhas dúvidas quanto à existência de base jurídica para o ajuizamento de um processo, mesmo sendo verdadeira a alegação de dispêndio de verba do erário. Mas isso, a meu sentir, é o menos importante da questão. Importa mesmo é ver a absoluta falta de compostura de Bolsonaro, fazendo pouco caso da liturgia do cargo que ocupa. Que existem pessoas de maus bofes e também aquelas que supõem engraçada qualquer besteira que enunciem, é uma verdade incontroversa. Em qualquer dessas categorias, ou de outras que lhes sejam assemelhadas, é um direito do presidente se enquadrar. Mas o que ele não pode (nem deve) é deixar que a galhofa se manifeste por intermédio de sua voz ou de seus gestos. O presidente da República precisa estar acima, muito acima, de tais vulgaridades.

Imaginemos o cenário: o anfitrião, na ânsia de ser simpático com o convidado, delibera servir a este um refrigerante que é um símbolo para os maranhenses nativos ou de coração. Depois de sorver um gole da bebida, o convidado indaga aos circunstantes se, a partir de então, teria ele “virado boiola”. E toda essa grosseria só porque o guaraná servido é de cor rosa. A macheza hercúlea de Bolsonaro não lhe permite que ele chegue perto de qualquer coisa que lembre, mesmo de longe, a existência de uma comunidade homossexual no Brasil.

Que e quanta falta de educação! Ainda que seja o mais acirrado homofóbico do país, o presidente não pode esquecer que, nas funções que exerce, ele governa todos os brasileiros, independentemente de raça, cor, credo e/ou opções sexuais. Raciocinemos ao contrário, com um exemplo singelo: que eu não suporto Bolsonaro parece ser ponto pacificamente estabelecido. Acho-o grosseiro, mal educado e inteiramente despreparado para as funções que o povo, em momento de rara infelicidade, lhe outorgou. Pois bem, admitam que essa figura execranda adentre o mesmo ambiente em que se encontra o escrevinhador destas linhas. Com toda a abjeção que sinto por ele, seria de meu elementar dever pôr-me de pé em respeito ao cargo de presidente do meu país. E eu faria isso sem nenhum constrangimento, da mesma forma como me levanto ao ouvir os acordes do hino nacional. Não é subserviência. É simples educação cívica.

Desabafo de uma cidadã brasileira nascida no Maranhão, após a galhofada presidencial: “Ele não respeita os maranhenses. Para os maranhenses, o Guaraná Jesus é o leite materno. Os nordestinos espalhados por todo o Brasil, quando bebem essa bebida cor-de-rosa, lembram-se de casa”. Eis a resposta/desculpa de Bolsonaro: “A brincadeira que eu fiz não foi televisão, não. Tava conversando com o cara “Pô, o guaraná é cor-de-rosa aqui”. Falei uns troços lá, alguém pegou, divulgou, não sei o que, como se eu tivesse ofendendo aí quem quer que seja no Maranhão. Muito pelo contrário. Com quem eu tava brincando era um maranhense, que levou na esportiva. Agora, a maldade está aí” — afirmou.       

Não é preciso comentar nada mais. O nosso estadista acha só se deve comportar corretamente se estiver à frente das câmeras de televisão. Fora disso, pensa que está liberado para alardear grosserias e tolices. E ainda acha maldade os comentários negativos. Estamos é bem fritos.

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