Muito permanece desconhecido sobre as mutações que compõem a nova variante Ômicron. Mas o que os cientistas sabem após 20 meses e várias novas cepas do novo coronavírus, é que uma ferramenta para conter a disseminação da infecção – o sequenciamento do vírus para detectar mudanças genéticas significativas – continua sendo usada apenas parcialmente.

A África do Sul, que anunciou a descoberta da nova variante na quinta-feira passada, está sequenciando apenas 0,8 por cento de suas amostras, ocupando 37º posição ente os países com 5.000 amostras ou mais. O porcentual está abaixo da taxa que os cientistas dizem ser necessária para manter informações atualizadas sobre as principais mudanças no vírus.

Apesar de ser um dos principais países do continente, a África do Sul possui um porcentual sequenciamento abaixo de outros países africanos. A posição na classificação, no entanto, ocorre pelo fato de nenhum outro ter ultrapassado a marca de 5 mil amostras sequenciadas (o Quênia está perto de ultrapassar e possui uma taxa superior).

O baixo sequenciamento não é exclusividade dos países africanos. Em locais que já foram o epicentro da pandemia – e com poder econômico superior – os índices de sequenciamento do vírus também são baixos. Nos Estados Unidos, que ocupam a 20ª posição, a taxa de sequenciamento é de 3,6% das amostras, de acordo com uma análise do The Washington Post considerando dados da iniciativa de rastreamento GISAID, que fornece um banco de dados global de genomas de coronavírus. Em dezembro do ano passado, a taxa era de 0,3%, chegando a 1% em abril.

A Índia, berço da variante Delta e centro de um surto devastador da doença no primeiro semestre, está sequenciando 0,2% das amostras – ante 0,06% em abril.

As maiores taxas de sequenciamento estão sendo, em grande parte, registradas entre os europeus, com taxas de vacinação comparativamente altas. A Islândia está no topo da lista, com 56,2% de suas amostras de vírus sequenciadas e mais de 88% de sua população totalmente vacinada, de acordo com um rastreador da Reuters.

Desde que o lançamento da vacina começou há quase um ano, os cientistas alertam para os ricos do monopólio dos estoques de vacinas, principalmente aos países ocidentais, às custas de uma distribuição global mais justa. Quanto mais tempo o vírus circula entre as populações não vacinadas, maiores são as chances de desenvolvimento de variantes altamente transmissíveis.

Apenas 6% dos 1,2 bilhão de pessoas na África são vacinadas, em comparação com cerca de 59% das pessoas nos Estados Unidos. Na África do Sul, até então considerada o berço da variante Ômicron, 35% de população está vacinada, de acordo com o Departamento de Saúde do país – apesar de outros centros de monitoramento apontarem que o número é menor.

Enquanto os Estados Unidos e alguns países da Europa estão fornecendo vacinas de reforço às suas populações, apenas cerca de 3% das pessoas em países de baixa renda estão totalmente vacinadas, de acordo com Gordon Brown, o embaixador da Organização Mundial de Saúde para o financiamento global da saúde e ex-premiê britânico.

“Até que vacinemos um número suficiente de pessoas, isso acontecerá continuamente”, disse Glenda Gray, chefe do Conselho de Pesquisa Médica da África do Sul, ao The Washington Post.

Autoridades sul-africanas criticaram as proibições de viagens impostas a seu país no fim de semana após o anúncio da nova variante, dizendo que tais medidas poderiam impedir outras nações de relatar novas variantes.

As restrições de viagem são “semelhantes a punir a África do Sul por seu sequenciamento genômico avançado e a capacidade de detectar novas variantes mais rapidamente”, disse o Ministério de Relações Internacionais e Cooperação da África do Sul em um comunicado. “Excelente ciência deve ser aplaudida e não punida”. (Estadão)

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