Se me fosse dado parafrasear Euclides da Cunha eu diria que o torturador é, antes de tudo, um covarde. Seria difícil entender como ato de coragem o comportamento de quem, tendo a vítima inteiramente sujeita, submete-a a procedimentos desumanos, na busca de que seja dita a palavra almejada pelo algoz.

Noticia a imprensa que a jornalista Miriam Leitão, à época com dezenove anos, foi presa pela polícia da ditadura militar. Grávida, foi obrigada a se despir diante de seus detentores e, auge da tragédia, foi posta em cela individual na companhia de uma cobra jiboia. Pois muito que bem. Foi desse episódio de todo em todo lamentável que fez deboche o deputado Eduardo Bolsonaro, indagando, na mídia e nas redes sociais, se a jornalista estava com saudade da serpente.

Que familiazinha complicada essa do presidente da República! O chefe, arrogante e ignorante, tece elogios abertos ao coronel Brilhante Ulstra, reconhecido como um dos mais ferozes torturadores dos tempos de chumbo da ditadura. O filho, confirmando as lições da genética, tripudia sobre as tormentosas lembranças de uma senhora, vítima da insanidade de um regime de opressão.

A quanto chegamos. Estivessem absolutamente normais as condições de temperatura e pressão da sociedade brasileira, o deputado debochador haveria de sofrer, pelo menos, a instauração de um processo por quebra do decoro parlamentar. Nem isso, porém, ele teme, na medida em que vê seu poderoso genitor fazer coisa pior e ainda ganhar apoio do que há de mais retrógrado e reacionário no meio político nacional.

Além de tudo isso, ainda se divulga a balela dos “três anos sem corrupção”. Mas que nome se pode dar à movimentação do chamado “orçamento secreto”? Por menos, por muito menos, Dilma Roussef se viu submetida a um processo de impeachment. De outra parte, será que mudou de nome a atividade dos “bispos” que, em missão sacratíssima, ocuparam o Ministério da Educação para de lá extrair propinas? Se isso não for corrupção, então a ação de doleiros e lobistas há de ser levada em conta pelo Vaticano, quando das próximas verificações de beatitude e santidade. E veja-se que os “bispos” (e coloco entre aspas como manifestação de respeito aos verdadeiros religiosos) sofisticaram a prática ilegal, uma vez que, não satisfeitos em abocanhar o produto de sua gatunagem, ainda exigiram o pagamento em ouro puro.

Santos homens. Por certo o metal precioso haveria de servir para ornamentar o manto de pureza com que eles se cobrem e com o qual distribuem as bíblias que foram usadas na transação ilícita. Mas estão todos eles dentro dos três anos de pureza e virtudes.

Só esses atos de deslavada corrupção já seriam suficientes para desacreditar o governo que aí se encontra. Mas o pior é que, paralelamente a eles, a insensibilidade do dirigente maior para com as questões sociais é um golpe de morte em quantos militam pela diminuição dos índices de miséria e pobreza. Se a pandemia já mostra (felizmente) sinais de que está em sua fase final, nem por isso desapareceram os seus graves e malévolos efeitos. Para estes, entretanto, o governo federal faz ouvidos de mercador e não se dá ao trabalho de apresentar um projeto de política pública para minimizá-los.

Estamos mesmo entregues às baratas (ou seria aos “bispos”?). Resta esperar o avanço do tempo para chegarmos logo a outubro e usar as eleições para afastar do poder esse celerado. Isso se ele se dispuser a respeitar a vontade manifestada nas urnas. Golpista por natureza, ele já prepara terreno para colocar em dúvida os resultados eleitorais. É um pândego.

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